Os pequenos rostos expressam concentração e empolgação diante das novas descobertas. Com lupas e microscópios, observam mundos minúsculos. Nos laboratórios, aprendem que é a partir de dúvidas, curiosidade, investigação e testes que a Ciência é construída. Desde 2018, mais de 50 crianças já participaram do projeto O Cientista que há em mim, promovido pelo Instituto de Biociências (Inbio). A iniciativa busca trabalhar metodologia e educação científica, com ênfase em microbiologia, aproximando crianças e adolescentes dos pesquisadores e da Universidade.
As atividades têm duração de 20 horas e funcionam como um curso de férias, onde os participantes conhecem o ambiente da Universidade e realizam diversas atividades que estimulam o despertar científico. “O curso é muito dinâmico e cheio de surpresas, não existe um roteiro, nem aula expositiva. As crianças são os cientistas, elas expõem suas dúvidas e hipóteses sobre os microrganismos e ao longo da semana vão desenvolvendo experimentos para respondê-las e testá-las”, relata a professora do Inbio e coordenadora do projeto, Ana Paula da Costa Marques.
As vagas do projeto são destinadas para alunos premiados na categoria Júnior da Feira de Tecnologias, Engenharias e Ciências de Mato Grosso do Sul (Fetec), que faz parte da programação do Integra UFMS, o maior evento de Ciência, Tecnologia, Inovação e Empreendedorismo de Mato Grosso do Sul. Além dos destaques da Fetec Júnior, parte das vagas remanescentes também são destinadas para crianças que se inscrevem para fila de espera.
Ao longo de uma semana, os participantes do projeto realizam a maioria das atividades no laboratório de Microbiologia, mas também visitam outros laboratórios do Inbio, como os de Zoologia e Parasitologia Humana e o Museu de Anatomia. Segundo a professora Ana Paula, a experiência de conhecer a Universidade e conviver com pesquisadores pode ser inspiradora. “Queremos despertar neles o interesse pela ciência e que, quando voltarem para casa, almejem estar numa Universidade e serem cientistas”, enfatiza.
Os estudantes da graduação e pós-graduação que compõem a equipe do projeto têm a importante missão de questionar, instigar e orientar o grupo de pequenos cientistas. A estudante de Ciências Biológicas, Lana Fioravante Pereira, participou da edição de 2023 e ressalta a curiosidade e empolgação das crianças na elaboração e teste de hipóteses. “Eles são super curiosos e fizeram muitas perguntas. Todos queriam testar suas hipóteses, testaram se tinha microorganismos nas folhas e flores das plantas, se tinha microorganismos no nosso corpo, testaram se após lavar a mão ainda tinha microorganismos ali”, relembra.
Matheus Eugênio Porto Barbosa é mestrando pelo Programa de Doenças Infecciosas e Parasitárias e um dos mediadores do projeto. Segundo Matheus, aproximar as crianças do espaço acadêmico pode trazer diversos aprendizados e contribuições para a ciência. “A curiosidade e inocência deles me encantaram, pois muitas perguntas eu nem me questionava. Isso validou ainda mais pra mim a necessidade da aproximação da ciência com o ensino básico, muitas perguntas podem se tornar experimentos e atividades incríveis. Todos os dias eles demonstravam um grande interesse e vontade de aprender. Muitos alunos até falavam que ainda iriam me encontrar pelos corredores da UFMS, o que é muito gratificante e demonstra que nosso trabalho foi bem feito”, conta.
O pesquisador ressalta ainda a importância do projeto para desmistificar a imagem do que é um cientista. “Durante o primeiro dia, pedimos aos alunos para desenharem uma imagem de um cientista e um artista. Entre os artistas encontramos a mais variáveis pessoas, já os cientistas eram desenhos de homens parecidos com o Albert Einstein. No final da oficina, percebemos que eles reconheciam que um cientista pode ser qualquer pessoa e não necessariamente apenas pessoas mais velhas, homens, ou pessoas com ar de “malucas”, e que eles também poderiam ser cientistas”, pontua.
Pelo olhar dos pequenos cientistas
“Acredito que um cientista tem que ser curioso, ter muitas dúvidas e ser um bom observador. O papel de um cientista é sempre estar pesquisando e buscando novas formas de resolver problemas”. Com a frase, Murilo Morais de Souza, de 9 anos, sintetiza um dos importantes aprendizados que obteve ao participar do projeto.
Para Murilo, participar do projeto permitiu conhecer um potencial futuro que existe para ele na Ciência. “Conhecer a UFMS para mim foi uma experiência nova, conheci várias pessoas e lugares diferentes, fiquei impressionado com tantas coisas que vi e aprendi. Gostei tanto que com certeza vou querer ser cientista”, enfatiza.
A mãe de Murilo, Geizy Morais, enfatiza que a empolgação do pequeno cientista era perceptível. “Todos os dias ao término do curso, ele estava alegre e com muitas novidades para contar, chegava sempre com novos aprendizados. Penso que todas as crianças deveriam ter oportunidade de ter contato com a ciência. Tanto as escolas quanto as famílias têm que incentivar esse contato para que as crianças enxerguem novas possibilidades”, relata.
Luiz Henrique Melgarejo Sena, de 8 anos, também participou do projeto em 2023. Em suas palavras, é perceptível a empolgação com práticas rotineiras no fazer científico. “Todos os momentos foram legais, mas o que eu achei mais legal foi fazer o experimento de colocar as bactérias no Ágar. Tinha que deixar na estufa e só no outro dia a gente ia ver. Então minha parte preferida era ver na lupa se as bactérias ou os fungos cresceram”, relembra.
O pequeno cientista conta que retornar à UFMS está entre seus planos de futuro. “Eu gostei muito de conhecer a UFMS, principalmente os laboratórios. Sei que isso vai demorar muito ainda, porque eu ainda estou no terceiro ano do fundamental I, mas quando eu terminar o Ensino Médio eu vou querer fazer faculdade de Computação. Aí com certeza vou querer ter oportunidade de estudar em uma universidade tão boa como a UFMS”, ressalta.
A mãe de Luiz, Viviane Franco Melgarejo, enfatiza a importância de incentivar a curiosidade e independência na busca por respostas. “Ele falou para mim que gostaria muito que essa oficina continuasse, que poderia ter mais dias. Eu considero que toda criança deve ser incentivada a pesquisar, não somente receber respostas prontas. O incentivo à ciência e à pesquisa é uma maneira de aprender muito mais eficiente do que dar respostas prontas”, pontua.
Para a coordenadora do projeto, Ana Paula da Costa Marques, ao abrir as portas da Universidade para o público infantil, um dos propósitos centrais é seguir despertando o cientista que existe em cada criança. “A educação é capaz de mudar a vida de uma pessoa, mas a ciência é capaz de mudar a vida de inúmeras pessoas, por isso acreditamos na educação científica. Como educadores e cientistas, temos responsabilidade na melhoria do ensino de ciências. Existem inúmeros jovens talentosos à espera de oportunidades e inspiração”, finaliza.
Texto: Alíria Aristides
Fotos: Arquivo do projeto