Pesquisas desbravam a alimentação saudável, o perfil do consumidor e o marketing relacionado ao tema

Que fatores podem incentivar a alimentação saudável, o consumo consciente, contra atacando a atual realidade da preocupação com o sobrepeso e a obesidade? Questionamentos assim estão sendo desvendados em pesquisas realizadas na Escola de Administração e Negócios (ESAN) da UFMS, inseridas no guarda-chuva “Segurança Alimentar No Brasil: Fatores Relevantes Para o Consumo Saudável”, coordenado pelo professor Filipe Quevedo Pires de Oliveira e Silva.

“A nossa preocupação é descobrir como propagar uma alimentação mais saudável entre a população, a partir de estudos sobre a alimentação, o conhecimento, a persuasão e as campanhas comunicativas”, explica o professor.

Com pesquisas de conclusão de curso e de iniciação científica, graduandos de Administração estão iniciando coletas de campo que envolvem questões como rotulagem, a percepção dos consumidores em relação as informações nutricionais, o entendimento sobre o que lêem nos rótulos, além do uso de redes sociais, como o Instagram, e de web influenciadores digitais no convencimento quanto a produtos ou ao estilo de vida mais saudável.

Além das pesquisas realizadas na UFMS, o professor Filipe Quevedo irá organizar e coordenar, em parceria com o professor Otávio Freire (USP), coletas nacionais sobre alimentação e uso de ferramenta online para alimentação saudável, com ida a campo no segundo semestre deste ano.

“Alguns estudos mostram que o uso da informação nutricional é positivo para o consumidor ter mais noção do que consome, mas sabemos que muitos não entendem o que estão lendo nos rótulos. De qualquer forma há uma pressão social e tem havido uma maior conscientização, com muita exposição na mídia de massa, o que tem auxiliado a análise do consumidor”, expõe Filipe.

Segundo o pesquisador, ainda não há clareza para muita gente sobre o que é o saudável, o que seria uma alimentação equilibrada, quanto deveria comer de cada macronutriente. “Questões de massa como consumir menos sódio, açúcar, gordura são mais corriqueiras, mas quando se vai mais a fundo quanto à alimentação equilibrada, poucas pessoas conseguem tomar uma decisão racional, mais consciente”, diz.

Se as pessoas realmente estão aprendendo mais sobre esse assunto, ou se sabem que devem comer melhor, mas não como fazê-lo é uma incógnita. Então, quando se tem a dúvida do ponto de vista do consumo, afirma Filipe, é mais facial acontecer erros,  como fazer escolhas erradas, como por falsos lanches saudáveis, que propagam no produto menos de algo que não é bom.

Ainda é muito baixo o nível de conhecimento dos consumidores, segundo o pesquisador, para quem ainda é necessária uma maior conscientização, educação mesmo para as pessoas entenderem o papel dos alimentos, como o organismo os processa, entre outras informações básicas.

Dificuldades

Coleta realizada em pesquisa de graduanda da ESAN com acadêmicos da UFMS apontou inicialmente que, por mais que tenha havido uma expansão da divulgação da alimentação saudável, por questões de limitação financeira, correria e conveniência, não há uma grande tendência de alimentação saudável entre os universitários.

“Muitos não são responsáveis pela compra do alimento em casa, outros são dependentes do restaurante universitário, não tem como definir necessariamente a dieta, mas vimos que não há uma grande preocupação com questões nutricionais na hora da escolha dos alimentos”, afirma o coordenador.

A coleta de dados será feita ainda com o público externo, envolvendo de 400 a 500 entrevistados. Além da alimentação, os pesquisadores questionam sobre a preocupação com a estética, conhecimento das pessoas em relação à alimentação, tanto o percebido como o real, porque muitas vezes as pessoas acham que sabem sobre as diferenças como, por exemplo, entre carboidrato e proteína, mas quando indagadas com mais profundidade sobre o tema mostram desconhecer.

As pesquisas também envolvem questões relacionadas ao marketing: qualidade da comunicação, aspecto lúdico da propaganda, escolha de celebridades durante a campanha, questões sociais, pressão de grupo, tendências.

“Em geral trabalhamos três aspectos: questões mais relativas ao conhecimento da alimentação e do alimento em si, questões do próprio consumidor – tanto sociais como psicológicas, e marketing de maneira em geral. Cada pesquisa especifica tem focado em algumas dessas variáveis”, diz o professor.

Crescimento

Nos últimos três a cinco anos, tem havido maior propagação de informação. “Mais pessoas entendem que uma alimentação com muito sódio pode ser ruim, por exemplo, mas se apertar muito não sabem o porquê, apenas que é prejudicial”.

Tudo isso também está relacionado com o nível educacional e o poder aquisitivo das pessoas. “Às vezes se tem a preocupação com a alimentação, mas a pessoa não tem condições de comprar. Da mesma forma é uma questão de hábito e conveniência, porque um pacote de bolacha pode ficar no armário e não vai estragar, mas quando se compra uma fruta precisa de uma disciplina maior para o consumo”, expõe Filipe.

Em muitos países houve a tendência da indústria para o processamento dos alimentos e agora se tem visto o retorno para os raw foods. “Isso é muito forte lá fora, mas está começando aqui. Em São Paulo, por exemplo, já há muitas lojas e butiques com essa pegada e é algo que tem começado a surgir aqui, mas ainda é um consumo de nicho em nosso país, mas com certeza uma tendência”.

As marcas têm se posicionado com relação a essa realidade. “Algumas estão tentando formular tendências para os próximos anos”, completa o professor.

Também tem aumentado muito a utilização de influencers pelas grandes marcas, contratados em especial para divulgação em mídias como Instagram e Youtube.

“Por ser seguidor, o consumidor tem alto envolvimento, gosta da pessoa, a conhece, e é justamente aquilo que uma celebridade tem de maior a oferecer, que é o relacionamento com seu público. Utilizando uma celebridade do instagram, talvez rede social mais utilizada para isso, a empresa consegue fazer a divulgação altamente direcionada ao público que quer atingir”, coloca.

Os estudos apontam que essas redes são ferramentas muito eficientes para propagar uma alimentação saudável, mas há um perigo, porque é sempre difícil separar a saúde do estético, principalmente para a juventude, aponta Filipe. “Até que ponto essa aspiração é saudável e quando isso passa a ser prejudicial, como no caso dos transtornos alimentares. Percebemos que o Instagram tem sido bastante utilizado e de fato tem efeito: atitude mais positiva em relação aos produtos oferecidos, em relação à marca, intenção maior de uso, mas que nem sempre vai resultar em compra”, completa.

Para o professor, faltam politicas públicas de conscientização, mostrar que uma boa alimentação saudável não passa necessariamente pela compra de produtos de marca. “Poderia ser pensando algo em educação formal para crianças, adolescentes. Que isso seja parte das discussões na escola, com cursos, palestras, envolvendo também os pais. Isso num médio prazo já teria resultados bastante significativos para uma melhora da alimentação da população”, finaliza o pesquisador.

Texto: Paula Pimenta