A UFMS iniciará a partir de agosto estudo sobre o Zika vírus em Mato Grosso do Sul. Para isso, abordará mulheres que estiveram gestantes, e que tiveram Zika ou não, entre os anos de 2015 e 2018.
“Os pesquisadores entrarão em contato com as mulheres, por via telefônica, convidando-as a participar do estudo. Aquelas que concordarem terão agendadas uma entrevista, e seus filhos poderão passar por consulta com a médica neuropediatra Maria Eulina Quilião”, explica o coordenador da pesquisa, professor Everton Falcão de Oliveira, do Instituto Integrado de Saúde (Inisa). Essa parte da pesquisa será desenvolvida pela aluno de mestrado Fabio Antonio Venancio.
Com caráter interdisciplinar e interinstitucional, a pesquisa abrange diferentes áreas de estudo, em parceria com pesquisadores de outras instituições públicas como a Fiocruz, UFRJ e secretarias da Saúde, e abrange orientação de estudantes de graduação, mestrado e doutorado.
O projeto contém duas abordagens metodológicas. A proposta é realizar estudo descritivo de corte transversal, com as crianças nascidas vivas e diagnosticadas com síndrome congênita do Zika (malformação congênita e/ou alterações neurológicas), e após um estudo do tipo coorte retrospectiva, que terá como alvo central gestantes que tiveram ou não Zika entre 2015 e 2018.
Em Mato Grosso do Sul, 185 mulheres gestantes tiveram a confirmação de contágio pelo Zika vírus no período de 2015 a 2018. “Precisamos olhar para todas essas mães que tiveram Zika durante a gestação e comparar com outras 185 mulheres que estavam gestantes no mesmo período e local, mas não tiveram diagnóstico confirmado por infecção desse vírus”, explica o professor.
Em ambos os grupos serão avaliadas variáveis socioeconômicas, demográficas, clínico-obstétricas, sorológicas, de imunização e fatores teratogênicos.
O Zika vírus pode ser transmito para a criança durante a gestação quando a mãe (gestante) estiver infectada. Para estabelecer a relação de causa e efeito entre a infecção materna e o nascimento de crianças com microcefalia, que é um dos sinais da síndrome congênita do Zika, uma sequência de eventos e critérios são necessários e este projeto de pesquisa tenta descrever esses critérios.
“Embora a hipótese de que a infecção dos fetos durante a gestação seja o fator crucial para o nascimento de crianças com microcefalia seja hoje amplamente aceita, alguns critérios necessários ao estabelecimento da relação de causa e efeito ainda não foram demonstrados. Por isso, queremos saber se a infecção pelo Zika na gestação foi fator primordial, foi a causa para as crianças nascerem com sintomas da síndrome congênita e faremos isto comparando dois grupos: um de gestantes que tiveram Zika e outro de gestante que não tiveram Zika”, explica o professor Everton.
No Brasil, a primeira associação entre a infecção congênita pelo vírus Zika e a ocorrência de malformação congênita foi feita em novembro de 2015 pelo Instituto Evandro Chagas (Belém, PA) e pela Fiocruz (Rio de Janeiro, RJ).
Os pesquisadores identificaram a presença do Zika vírus em fragmentos de tecido de um recém-nascido e no líquido amniótico de uma gestante. Mesmo que a magnitude do risco ainda não tenha sido comprovada, a literatura científica aponta o desfecho de malformação congênita em decorrência da transmissão vertical do Zika vírus entre 1% a 13%.
Estudo com as crianças
Em uma primeira etapa, os pesquisadores do Inisa conduziram estudo descritivo transversal para avaliar o perfil clínico e epidemiológico dos nascidos vivos de gestantes infectadas com o Zika vírus em Mato Grosso do Sul, entre 2015 e 2018. Foram notificadas 71 crianças como casos suspeitos de malformação congênita e/ou alterações neurológicas (síndrome congênita do Zika). Todos esses casos foram avaliados e triados para confirmar o diagnóstico de síndrome congênita.
Toda criança de mãe que teve Zika durante a gestação deve ser acompanhada até os dois anos, independentemente se a criança nasceu com microcefalia ou não. “Se a criança nasceu com microcefalia ou outras alterações congênitas, deve ser acompanhada pelo o resto da vida. Só que em Mato Grosso do Sul não havia informações sobre essas crianças, se estavam acompanhadas ou não. Por isso, verificamos todas as notificações no sistema do Ministério da Saúde, via Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul, para averiguar se de fato os casos notificados eram de síndrome congênita do Zika”.
Dentre os 71 casos notificados, 14 apresentaram evidências de realmente se enquadrarem como casos de síndrome congênita do Zika vírus, a partir da análise fundamentada pela avaliação clínica (neurológica e motora) e por exame de imagem, em algumas situações.
Todas as crianças com síndrome congênita devem ser encaminhadas para fisioterapia (para estimulação precoce), terapia ocupacional, fonoaudiologia, neuropediatra e mãe a e filho devem ainda ser acompanhados por psicólogo.
Mas, em Mato Grosso do Sul, apenas cinco estavam sendo atendidas pelo Centro Especializado de Reabilitação da Apae (CER-APAE). Outras cinco começaram posteriormente, a partir do projeto de pesquisa, a serem atendidas na Clínica Escola da UFMS, por meio de parceria firmada com o CER–APAE e a Residência em Reabilitação Física (Inisa), onde os pequenos são atendidos às segundas e quartas-feiras.
“A condição socioeconômica dessas famílias é bem baixa, muitas têm dificuldades de acesso, de locomoção. As crianças apresentam paralisia cerebral, precisam de cadeira de rodas e isto acrescenta um adicional de agravo que dificulta a chegada delas até aqui”, completa o professor.
Paula Pimenta