Pesquisadores do Laboratório de Sistemática, Biogeografia e História Natural de Anfíbios e Répteis – Mapinguari (Inbio) dão ouvido aos coaxar de sapos, rãs e pererecas em diversas regiões do Brasil e somente no último ano já descreveram três novas espécies, com outros mais a serem apresentados nos próximos meses ao mundo científico.
Em homenagem aos índios Munduruku, habitantes da Amazônia, entre o sudoeste do estado do Pará e norte de Mato Grosso, os pesquisadores do Mapinguari batizaram uma nova espécie de sapo de Ameerega munduruku, um pequenino animal que não mede mais de três centímetros, com dorso preto, listras brancas laterais, manchas negras, e uma faixa laranja na região axilar.
As espécies desse gênero apresentam coloração aposemática – brilhante, que chama atenção, sendo um colorido de advertência, por ser uma espécie venenosa, ainda com os efeitos do veneno desconhecidos, mas com potencial antibactericida.
Esses sapinhos são bichos de floresta, que se escondem na mata ou em pedras. São animais diurnos, diferindo da maioria dos anfíbios que possuem hábitos noturnos.
O artigo de descrição, publicado na revista alemã Salamandra, é assinado exclusivamente por graduandos, pós-graduandos e pelo professor Diego Santana, coordenador do Mapinguari.
As coletas da espécie ocorreram em Paranaíta (MT) e Jacareacanga (PA). Os pesquisadores trouxeram o animal, investigaram e descobriram tratar-se de uma espécie nova.
“É raro encontrarmos um trabalho que seja exclusivo de um grupo, geralmente há parcerias entre universidades e laboratórios. A descoberta do animal foi feita pelo doutorando Matheus Oliveira Neves e o Mestrando Leandro Alves da Silva, e o trabalho foi feito aqui no nosso laboratório”, diz o professor.
Espécie criticamente ameaçada, a Phasmahyla lisbella também foi descrita no Laboratório Mapinguari. Nova espécie de rã, com três centímetros, pouco peçonhenta, é caracterizada por ter pele dorsal granulosa, com presença de manchas roxas nas áreas dos braços, parte interna das pernas e flancos alaranjados, com manchas violetas.
A perereca pintada foi descoberta na Mata Atlântica, em Miracema, no Rio de Janeiro, restrita a dois riachos na região. “Nós analisamos a vocalização, sequenciamos o DNA e convencidos de que era uma nova espécie publicamos o artigo cientifico na revista PeerJ”, explica o professor Diego.
Esse é o primeiro holótipo (individuo que representa a espécie) da Coleção Zoológica de Referência (ZUFMS) e agora será feita permuta de material com o Museu Nacional do Rio de Janeiro.
Também ameaçada, outra espécie de anfíbio recém-descrita teve publicação de artigo na revista americana Herpetologica. O Proceratophrys ararype foi descoberto no Ceará, na Chapada do Araripe, pela Pós-Doc Sarah Mânglia.
“Dos oito pesquisadores que assinam o artigo, quatro trabalham no Mapinguari. Essa espécie é endêmica da região, encontrada apenas nas encostas da Chapada e é irmã de espécies da Amazônia. Na época do Pleistoceno a Caatinga não existia. A Amazônia era uma só e seus animais chegavam até essa região do Nordeste. Mas houve a regressão amazônica com a expansão da Caatinga e esses bichos, que especiaram, conseguiram se manter na encosta porque é úmida, uma floresta naquele ponto”, explica o professor.
Duas coisas chamam atenção, segundo o professor: o fato de ser um bicho da Caatinga, com parentes da Amazônia e por só ser encontrada nessas encostas. “Ali há várias espécies ameaçadas porque estão numa floresta no meio da Caatinga. Os bichos vivem em riachos, que são utilizados para agricultura e recreação e onde há bastante desmatamento. Acabou o riacho, acabou o sapo, por isso é mais uma espécie ameaçada de extinção”.
Com coloração marrom e perfeita técnica de camuflagem, os machos têm entre três e quatros centímetros e as fêmeas cinco.
Serpentes de Campo Grande
O grupo acabou de publicar também a primeira lista de serpentes para Campo Grande, realizada com base em espécimes abrigados na Coleção Zoológica da UFMS, composta de 38 espécies de 21 gêneros, sendo sete peçonhentas.
“Também é uma lista feita completamente por pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal. Agora sabemos quais as espécies de serpentes em Campo Grande e isso é muito importante até para conhecermos o padrão de distribuição delas e para ajudar à saúde pública que precisa disponibilizar soro antiofídico para cada tipo de espécie em separado”, afirma o professor.
Vale destacar que a ZUFMS foi considerada a de melhor representação no Species Link, que apresenta coleções de todo o mundo, o que valeu menção honrosa à Coleção Zoológica de Referência (ZUFMS).
As espécies estão distribuídas nas famílias Dipsadidae (21), Colubridae (6), Viperidae (5), Elapidae (2); Anomalepididae, Boidae, Leptotyphlopidae e Typhlopidae (1 cada).
“A fauna de serpentes de Campo Grande é caracterizada por espécies típicas de habitats abertos, alguns dos quais são endêmicos do Cerrado (por exemplo, Trilepida koppesi, Chironius flavolineatus, Chironius quadricarinatus, Simophis rhinostoma, Erythrolamprus frenatus, Phalotris matogrossensis, Bothrops moojeni e Bothrops pauloensis). Apesar do número de espécies encontradas, nossa curva de acumulação mostra que a riqueza no município é maior, e mais esforços de amostragem são necessários”, apontam os pesquisadores.
Expansão
Com três Pós-Doc, seis doutorandos, oito mestrandos, dois alunos de Iniciação Cientifica e outros graduandos e colaboradores, o Laboratório Mapinguari recebe pesquisadores/alunos de todas as regiões do Brasil e de outros países da América do Sul.
“A forte divulgação do trabalho aqui realizado tem chamado a atenção de muitos pesquisadores, que quando se juntam ao grupo trazem consigo suas parcerias, networking”, diz Diego.
Além de pesquisas na Bodoquena e no Pantanal, os herpetologistas do Mapinguari também estão presentes em outras regiões do Estado, como no Parque Estadual das Várzeas do Rio Ivinhema e Parque Estadual Nascentes do Rio Taquari (Alcinópolis e Costa Rica).
“O Taquari é a região com maior diversidade de anfíbios no estado de Mato Grosso do Sul. Antes era a Bodoquena com 38 espécies, mas lá em duas campanhas registramos 43”.
Os alunos membros do Mapinguari constantemente são convidados a trabalhar a educação ambiental no Parque de Taquari, onde tratam do funcionamento da biodiversidade, importância da preservação, descrevem e apresentam espécies, falam de suas pesquisas para crianças e adolescentes de escolas do local.
Em Campo Grande também estão presentes em atividades no Projeto Brejo Bonito e escolas. “Queremos desmistificar essa ideia que as pessoas têm dos cientistas, apenas enclausurados em laboratórios”, completa Diego.
Conheça mais sobre o trabalho do Mapinguari em:
Facebook: https://www.facebook.com/mapinguariufms
Insta: https://www.instagram.com/mapinguariufms/
Site: https://diegojsantana.weebly.com/publications.html
Paula Pimenta