Pesquisa investiga potenciais inibidores da enzima acetilcolinesterase para o tratamento da doença de Alzheimer

Principal causa de demência entre os idosos, a doença de Alzheimer é um grande quebra-cabeça com muitas peças ainda por encaixar, e que se alastra rapidamente na atual realidade de aumento de expectativa de vida.

Diante dessa “epidemia” neurodegenerativa, e enquanto muitas questões ainda são pesquisadas, como a real causa da doença e sua possível cura, os pesquisadores têm em mãos outro importante desafio: melhorar a qualidade de vida dos atuais e futuros pacientes.

Grupo de Pesquisa Bioquímica Experimental e Aplicada, do Laboratório de Bioquímica Geral e de Microrganismos (LBq)

Esta proposta foi encarada pelo Grupo de Pesquisa Bioquímica Experimental e Aplicada, que investiga a síntese da hipaforina e derivados, com coordenação dos professores do Laboratório de Bioquímica Geral e de Microrganismos (LBq) do Instituto de Biociências (Inbio) Edson dos Anjos dos Santos e Jeandre Augusto dos Santos Jaques.

Os atuais fármacos – pelo menos quatro aprovados internacionalmente – atuam de forma a inibir a enzima acetilcolinesterase, responsável pela degradação da acetilcolina, neurotransmissor importante no sistema nervoso central.

O problema é que esses fármacos são acompanhados de efeitos colaterais, que muitas vezes debilitam ainda mais a saúde já comprometida dos idosos acometidos pela doença e outras comorbidades. “Os fármacos aprovados possuem muitos efeitos colaterais, principalmente acabam acarretando problemas no fígado. O paciente está tratando uma doença, mas acaba surgindo outra e muitas vezes esses idosos já estão debilitados”, expõe o professor Edson dos Anjos dos Santos.

A doença leva ao declínio das funções cognitivas, interferindo nas capacidades comportamentais e de raciocínio da pessoa e, já no início, há perda da memória mais recente, evoluindo para falhas na aprendizagem, atenção, compreensão, orientação e na própria linguagen.

“Nos pacientes com Alzheimer, é conhecido que há uma redução dos níveis do neurotransmissor acetilcolina e a enzima acetilcolinesterase hidrolisa, degrada, diminui os níveis desse neurotransmissor. Então utilizando inibidores, os pacientes conseguem manter níveis um pouco melhores, de forma que os sintomas da doença não avancem para casos mais graves”, explica o professor Jeandre Jaques.

Hipaforina

Com apoio da Fundect, Capes e CNPq, a pesquisa estuda a enzima acetilcolinesterase, que possui ação no sistema nervoso central e investiga a L-hipaforina como seu potencial inibidor. Os pesquisadores sintetizam ainda o seu enantiômero, a D-hipaforina, além de outros derivados.

“São dois compostos diferentes – a L e a D-hipaforina – possuem a mesma fórmula  molecular, contudo a disposição espacial dos grupos na molécula é diferente. É de conhecimento que esses tipos de compostos possam ter atuação biológica distinta – isso pode evitar, por exemplo, um efeito colateral, por isso precisa ser pesquisado”, completa o professor Jeandre.

“Pensamos nessa substância por ela também ser encontrada no organismo, por conta da alimentação, já tendo sido detectado no leite materno pela provável ingestão de alguns grãos. Se ela vier a ter essa atividade inibidora, talvez poderia ter uma ação no sistema nervoso central do paciente com uma menor toxicidade”, completa o professor Edson.

As primeiras análises e descobertas levaram a um projeto mais amplo, com estudo de derivados e também com estudo de outras moléculas similares da classe das aminas quaternárias, que é o composto da hipaforina.

Os pesquisadores realizaram o teste em regiões específicas do cérebro como o hipocampo, o córtex, o cerebelo e o corpo estriado. “Porque cada região encefálica têm funções diferentes. Por isso, fizemos o ensaio para ver se ela possui inibição especifica para uma dessas regiões”, explica o professor Edson.

Os trabalhos estão sendo realizados também em cooperação com outros grupos de pesquisa da UFMS como o dos professores Carlos Alexandre Carollo e Denise Brentan da Silva (Lapnem) e também tem parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), por meio do professor Euzébio Guimarães Barbosa, responsável pelos testes de docking molecular da enzima.

“A análise por docking molecular é um estudo através de sistemas computacionais que mimetizam a ação biológica de substâncias em um alvo específico, como a própria enzima acetilcolinesterase. Pelo docking molecular descobrimos onde os inibidores se ligam, o quanto interagem com essa enzima, porque a inibição depende dessa interação”, diz Edson. “Isso auxilia na explicação dos resultados das atividades biológicas in vitro, e auxiliam o desenvolvimento de novos inibidores”, completa.

Doutorando Murilo Aquino Kioshi Yonekawa, recentemente premiado com pesquisa na área

Alunos de Mestrado, Doutorado e Iniciação Científica da UFMS participam das pesquisas. O doutorando em Química Murilo Aquino Kioshi Yonekawa foi recentemente premiado com a pesquisa na área no Congresso Internacional Current Topics in Biochemistry 2018.

“Realizamos aqui a pesquisa básica. Começamos analisando uma estrutura e vendo seu potencial – a tendência sempre é tentar melhorar, fazendo modificações estruturais, para potencializar a ação e caso venha a existir um composto com uma boa atividade e menor toxicidade, existe uma expectativa de realizar uma patente. O que queremos é contribuir nessa área de desenvolvimento de protótipos de fármacos para o tratamento da doença de Alzheimer”, aponta o professor Edson.

Aumento

Projeções da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que as demências deverão triplicar dos atuais 50 milhões de enfermos até 2030, sendo o mal de Alzheimer responsável por 60-70% dos casos.

“Então, existe uma grande preocupação porque essa é a demência que mais atinge a população mundial. Como a expectativa de vida aumenta, há também crescimento do número de casos no Brasil”, coloca o professor Edson.

A pesquisa “Panorama prospectivo das demências no Brasil: um enfoque demográfico” (Burlá, 2013) apresentou projeções de crescimento do número de casos para a população brasileira acima de 65 anos, chegando a 7,9% em 2020, com 55 mil novos casos por ano.

Conforme a pesquisa, devido à longa perspectiva de vida, a comunidade japonesa de Campo Grande apresentou uma taxa bruta de 12,10% casos a partir de 65 anos, sendo 11,4% entre os homens e 12,6% entre as mulheres.

A média é considerada alta, bem superior a média da população na América Latina que é de 7,6% entre os acima de 65 anos.

Paula Pimenta