Identificar em que área, como e onde trabalham as mulheres em Mato Grosso do Sul, de que forma relacionam o trabalho com as atividades da família, como organizam e dividem essas responsabilidades, são propostas mestras de pesquisa desenvolvida no Campus de Paranaíba (Cpar).
Com o título “O trabalho das mulheres em MS: a conexão entre o rural e o urbano”, a professora do curso de Psicologia do Cpar Ana Cláudia dos Santos, coordenadora do projeto, quer conhecer as práticas de trabalho das mulheres em MS a partir da produção acadêmica das universidades ou faculdades no estado.
“Também queremos identificar as áreas de atuação das mulheres, ou seja, no comércio e serviços, indústria, no setor rural e no agronegócio. Isso tudo para analisar o trabalho feminino diante deste cenário de transformações e mudanças no mundo laboral que vivemos, e de que forma a mulher se coloca neste cenário considerando sua relação junto a família”, explica a professora.
Algumas situações são bem conhecidas, já que, de maneira geral no Brasil há diferenças de gênero, por exemplo, nas formas como o trabalho é desenvolvido, na remuneração, qualificação exigida para diferentes postos de trabalho.
E essa realidade será atualizada para o estado, segundo a pesquisadora. ”Somos um estado rural com uma agricultura familiar presente e o agronegócio. Então, você identifica que há locais onde há uma grande produção no agronegócio, como a região de Chapadão do Sul e em outras áreas a predominância do comércio, mas também voltado para o agronegócio, para o produtor rural”.
A professora destaca que o agronegócio sofreu diversas mudanças nos últimos anos, como na introdução de novas tecnologias na organização do trabalho, exigindo dos trabalhadores uma qualificação específica para responder à mecanização ou tecnificação do processo no campo.
“Essas transformações são modelos de organização de trabalho da indústria que foram implantados no agronegócio. E no caso das mulheres, elas vivenciaram essas mudanças e, hoje, os mercados exigem novos conhecimentos para o exercício de um trabalho de alta produtividade”, completa Ana Cláudia.
Além disso, tem sido observado que a mulher ganha espaço de atuação no agronegócio, não só na produção, mas também na gestão, algo novo, diz a pesquisadora, e que por isso merece ser estudado.
Da mesma forma, identificam-se mulheres atuantes no comércio ou na indústria, gestoras, na vanguarda de seus trabalhos.
”Há uma conexão entre o rural e urbano nestas pesquisas. Paranaíba, por exemplo, é cidade, é urbana, mas com valores e características do mundo rural. É uma cidade-rural. E aí, estamos falando do trabalho, das relações de trabalho entre patrões e empregados, da responsabilização das mulheres pelos afazeres domésticos mesmo trabalhando na cidade, estudando e tendo como responsabilidade os filhos e a casa, tudo está envolvido”.
Multijornada
Mesmo saindo de casa para o trabalho, as mulheres continuam como responsáveis pelas atividades domésticas, pelos cuidados com a família, devendo achar ainda tempo para se qualificarem.
”Ao voltar para casa depois do trabalho, elas continuam a trabalhar, só que agora, dentro da casa. E isto acontece também no campo, ela vai para a lavoura e volta para casa e cuida dos filhos e da casa. Tudo responsabilidade da mulher. E este trabalho todo não é visto! É um trabalho invisível! É naturalizado, faz parte da condição de ser mulher cuidar da casa, dos filhos e trabalhar fora, quando encontra um trabalho, deve se qualificar! É pesado!”, expõe a pesquisadora.
As mulheres representam 48,5% da força global de trabalho (OIT/2018), sendo a principal responsável pelos cuidados familiares e afazeres domésticos. “E tem o desequilíbrio econômico que ela tem que ‘ajeitar’ pois, em muitas famílias no Brasil é a mulher que é a chefe-de-família, a responsável pelo sustento da casa”, pontua Ana Cláudia.
A professora sinaliza que o mundo do trabalho vive uma transformação em todas as áreas, inclusive a rural onde a mulher também está trabalhando, porém nesta área suas práticas são pouco conhecidas pela academia, principalmente pela Psicologia.
“Saber o que pensam as mulheres no mundo do trabalho, no trabalho desenvolvido nas ruralidades, é conhecer os modos de vida, relações com a comunidade, sentimentos, emoções, ou seja, subjetividade desta trabalhadora, suas necessidades e, torna-se imprescindível conhecer estes aspectos para compreender sobre como vivem e identificar mudanças, necessidades de colaboração, intervenção e planejamento em políticas públicas”, completa.
Análise psicológica
A partir da análise das práticas de trabalho das mulheres, a pesquisadora quer compreender a dimensão psicológica, o que pensam e como estabelecem suas relações interpessoais, além da questão da intersubjetividade.
“É o trabalho o objeto de investigação, sendo categoria fundamental para compreensão das relações sociais envolvidas como no caso deste estudo, sua relação de trabalho e família. São os estudos da Psicologia Social e do Trabalho que fundamentam as análises desta pesquisa”, diz.
Para isso, será realizada uma pesquisa bibliográfica sobre todo trabalho científico, ou seja, artigos, monografias, teses ou dissertações, que contemplem as práticas de trabalho realizadas pelas mulheres no período que se inicia com a fundação do estado.
A produção acadêmica será analisada a partir dos fundamentos teóricos da Psicologia Social e do Trabalho obtidos do contato com as bibliotecas via Repositório Institucional.
Também será pesquisado em duas bases de dados, Capes-Periódicos e Scielo, para identificar possíveis trabalhos que não foram acessados via Repositório Institucional.
A pesquisa gerou dois projetos de iniciação científica que estão em desenvolvimento. O primeiro tem como proposta conhecer o trabalho das mulheres no assentamento Serra de Paranaíba, desenvolvido pela aluna Brunna de Oliveira Freitas, com o título “Trabalhadoras Rurais: as mulheres do assentamento Serra”.
A outra pesquisa de iniciação estuda o trabalho das mulheres em Paranaíba, da aluna Carolina Helena de Moura Zamai, com o tema “Mulheres, suas práticas de trabalho e subjetividade em Paranaíba – MS”.
Há ainda uma orientação de Trabalho de Conclusão de Curso em desenvolvimento que discute a liderança da mulher nas empresas, desenvolvido pela aluna Joice Aparecida Costa.
“Existem muitas pesquisas em diversas áreas sobre o trabalho das mulheres, porém, quando se trata de conhecer essa realidade nas ruralidades e, a partir da área de conhecimento da Psicologia, as pesquisas desenvolvidas não são suficientes. Há muito espaço para desenvolver estes estudos no que se refere a compreensão da realidade de vida e trabalho assim como da subjetividade dos trabalhadores e trabalhadoras das ruralidades”, finaliza a professora.
Texto: Paula Pimenta