Nesta quarta-feira, como parte da programação científica da SBPC Educação, foi realizada mesa-redonda para discutir políticas de expansão da educação superior. Participaram os professores Romualdo Portela de Oliveira, da Universidade de São Paulo, que falou sobre financeirização; Giselle Cristina Martins Real, da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) que falou sobre regulação da qualidade e a Carina Elisabeth Maciel, da UFMS, que tratou do tema perspectivas de inclusão.
“Precisamos pensar na educação superior não apenas como acesso ao mercado, mas que também possa gerar conhecimento e maior conscientização”, ressaltou Carina. A professora trouxe parte dos dados coletados durante sua pesquisa de doutorado, cujo objetivo foi analisar as categorias de inclusão, acesso e permanência como desafios para a expansão da educação superior no Brasil.
Durante sua pesquisa, Carina investigou conceitos como inclusão, acesso e permanência. “Utilizamos como fontes dados do Ministério da Educação, do INEP e IBGE”, explicou. De acordo com a professora, alguns consensos acabam se materializando na Universidade. “Identificamos políticas como resultado de esforços político-partidários e sob a influência das tendências neoliberais para esclarecer que, mesmo documentos primários, como as leis, são resultado de embates políticos e da luta que se concretiza nos consensos resultantes dos diversos interesses sociais, econômicos e políticos que são intrínsecos aos sujeitos sociais que as elaboram”, comentou.
O período escolhido por Carina engloba os anos de 2003 a 2016. “Partimos do pressuposto que as políticas foram materializadas sob o discurso de inclusão, entendido como forma de minimizar os efeitos da crise econômica e social, destinando à educação um papel determinante”, destaca Carina. Segundo a professora, os organismos oficiais vêm entendendo a educação como meio para fornecer instrumentos às pessoas para que possam trabalhar e aprimorar a mão de obra e, assim, auxiliar na melhora do desenvolvimento do país.
“As políticas destinadas para a educação superior consistem em uma construção social que representa os embates travados entre classes distintas, mas com consensos possíveis, estabelecidos pelos intelectuais e apropriados pela massa de sujeitos que constituem a sociedade”, pontuou. “Quando trabalho com conceito de inclusão, quando vejo esse termo como mega objetivo, no início parecia ser um discurso apenas para angariar votos. Mas, quando analisamos, vimos que a inclusão é um objetivo que vem sendo desenvolvido em condições especificas”, acrescenta.
Para a professora, hoje, a questão ideológica vem se desenvolvendo com tamanha força que, ela não pensava que haveria possibilidade de desvelar tantas posições e princípios que acreditava estivessem já estivessem bem resolvidos.
Carina apresentou alguns dos dados coletados, que estão relacionados a isso. Por exemplo, a porcentagem de matrículas da população de 18 a 24 anos, entre os anos de 2012 a 2018. “Ao nos debruçarmos nos dados estatísticos, percebemos que a proporção de alunos matriculados na educação superior com idade de 18 a 24 anos, em relação ao total da população nessa faixa etária é de 44,2%. A isso chamamos taxa bruta. Já ao observarmos a taxa líquida, ou seja, a proporção de alunos de 18 a 24 anos na educação superior, em relação ao total da população nessa faixa etária, esse número cai para 21,8%”, comenta.
Carina destacou que o sistema escolar brasileiro reproduz diversas desigualdades sociais. “E importante evidenciá-las para que as políticas públicas sejam colocadas em prática de forma mais equitativa. Por isso é essencial a análise de recortes por região, localidade, renda e raça/cor.
Um dos indicadores dessa desigualdade reflete-se na taxa de matrícula líquida na Educação Superior, quando levamos em consideração a variável raça/cor. “Em 2018, 15,1% da população matriculada é preta, enquanto que 30,7% dos matriculados são brancos. Os que se dizem pardos são 16,3%. Em nenhum momento aparecem indicadores de matrículas de indígenas ou pessoas com deficiência. Onde estão esses dados? Por que não aparecem?”, indagou a pesquisadora.
Outra grande diferença pode ser observada ao comparar a taxa de matrículas dos estudantes que moram no campo com a dos estudantes que estão nas regiões urbanas: apenas 8% do total de jovens com idade entre 18 e 24 anos está na educação superior. Esse número é três vezes menor ao dos estudantes que residem nas cidades.
Em relação ao tripé ensino, pesquisa e extensão, outro indicador preocupa: do total de 2.448 instituições de ensino superior, 2020 são faculdades e apenas 199 são universidades. Do número total de universidades, quase metade está concentrada na região Sudeste. “Na região Centro-Oeste, são apenas 14 universidades das 240 instituições”, ressalta Carina. A professora também fez uma comparação dos números de matrículas nas instituições públicas e privadas, percebe-se que do total de mais de 8 milhões, as públicas são responsáveis por praticamente um terço. “A partir desses indicadores, podemos entender que a elação fundamental entre ensino, pesquisa e extensão não necessariamente se materializa como tal. Essa relação está mais forte e se materializa na educação superior pública”, aponta.
De acordo com a professora Carina, as políticas e ações que favorecem o acesso aos direitos básicos para grupos considerados excluídos, atendem pequena parcela da população. “O conceito de inclusão representa a minimização de fraturas sociais, porém não altera a condição que as gera. Mas entendemos que, sem essas políticas, o acesso não seria nem possível”, pontua.
Já os significados que derivam do conceito acesso, a pesquisa apontou que nas políticas acesso é utilizado como sinônimo de ingresso. “Identificamos que esse termo só tem sentido quando significa: ingresso, permanência e conclusão. Conquistamos alguns avanços com relação ao ingresso de estudantes oriundos do ensino médio público e estudantes negros, mas com relação aos estudantes indígenas, os dados não expressam os mesmos resultados, assim como para pessoas com deficiência”, explica a professora.
“Ao olharmos para o termo permanência, nas políticas de educação superior, é utilizado como sentido de manter os alunos nos respectivos cursos. Com base nas ações das instituições pesquisadas, a permanência está relacionada com as ações destinadas à assistência estudantil e tem como base o PNAES e PNAEST”, fala Carina. De acordo com as análises, o termo permanência significa continuidade no curso e conclusão no mesmo e, a partir dos dados, a professora Carina destaca que “as instituições precisam rever suas ações de permanência, levando em consideração o perfil dos estudantes de cada uma delas, bem como, considerar aspectos diversos para elaboração dessas ações, como os aspectos econômicos, sociais, acadêmicos, pessoais e regionais”. Ainda em relação à permanência, a professora observou que apesar de alguns projetos não terem como objetivo central a permanência dos estudantes, acabam gerando vínculos dos mesmos com as instituições e fazem com que eles concluam os cursos e não abandonem os estudos. “Por isso, podemos dizer que os programas de bolsas são importantes, mas não são as únicas formas de manutenção dos acadêmicos. Assim outras questões precisam ser consideradas”, conclui.
Texto e fotos: Vanessa Amin