Mapeamento de Javalis em MS recebe colaborações da comunidade

Como tese de doutoramento em Ecologia e Conservação pela UFMS, o Biólogo e Doutorando Wagner Fischer está realizando o mapeamento da invasão de javalis asselvajados em todo o estado de MS. No levantamento de informações, o trabalho conta com a participação da sociedade, que pode colaborar por meio de um questionário online. Os objetivos são: identificar as regiões onde mais ocorrem populações do animal; os motivos da sua presença na região; e as possíveis rotas de deslocamento (dispersão), caso a invasão de javalis e de seus híbridos asselvajados (conhecidos como javaporcos) continue avançando.

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De acordo com Fischer, o interesse pelo assunto surgiu após consecutivas experiências com manejo e gestão da fauna no Brasil. “Sempre gostei de trabalhar com manejo de fauna e já conhecia o problema do javali europeu no País. Isso despertou a curiosidade e o interesse em verificar mais de perto como estaria a complicada situação em Mato Grosso do Sul, que hoje agrega uma grande mistura de linhagens de porcos exóticos asselvajados (Sus scrofa) de origens bastante diversas. Além da miscigenação do javali com as várias raças de porcos domésticos – formando linhagens híbridas chamadas de javaporcos – há também o porco-monteiro, linhagem mais antiga de porcos invasores no Pantanal, originada de raças de porcos domésticos também em estado feral. Descobri que havia esforços e estudos gerais sobre essas ocorrências no território nacional, e pensei que uma pesquisa específica sobre o assunto em MS poderia ser bem relevante para o manejo e controle da espécie no estado, cuja gestão envolve questões bastante complexas”, explica.

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Segundo esclarece o pesquisador em artigo recente publicado na Revista Ciência Pantanal, o Javali foi trazido ao Brasil por criadores para exploração comercial da carne. Entretanto, livre na natureza, o animal se torna uma poderosa praga invasora. Fugas e solturas oriundas dos próprios criadouros, do comércio clandestino e da livre procriação desses animais com outras raças e linhagens de porcos domésticos nas áreas rurais, resultaram em populações de híbridos bastante férteis e vigorosos. Hoje, javalis e javaporcos dominam amplas áreas em diversos estados do Brasil, trazendo consigo danos e prejuízos não apenas a produtores rurais, mas também ao meio ambiente, à saúde e segurança públicas.

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Por ser invasor exótico, o Javali não tem predador natural por aqui. Em 2000, ele passou a encabeçar a lista das 100 piores espécies invasoras do Planeta, elaborada pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). Desde então, a recomendação da entidade é considerar todas as populações exóticas e asselvajadas de Sus scrofa (nome científico do Javali) como pragas e, portanto, adotar ações imediatas de controle e, se possível, promover sua erradicação.

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Desde 2013, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) permite a caça do animal no Brasil para fins de manejo e controle da invasão da espécie. Entretanto, Fischer concorda com os demais especialistas sobre a inviabilidade técnica e financeira para realizar a erradicação do javali num país continental como o Brasil. “Isso, porém, não significa que o javali não deva ser controlado ou impedido de atingir áreas críticas e sensíveis, ou até mesmo extinto em determinados locais que necessitem proteção ou em que as populações possam ser isoladas. É preciso estabelecer limites e restringir seus espaços o quanto antes”, conclui o pesquisador.

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Impactos e prejuízos

Os impactos causados por porcos ferais Sus scrofa (javalis, javaporcos e também por porcos-monteiros no Pantanal) são inúmeros e incalculáveis, alguns nem sequer são visíveis ou conhecidos. Vão desde a predação de animais silvestres e domésticos ao revolvimento do solo e deflagração de processos de erosão. “Os javalis/javaporcos podem também atacar fatalmente seres humanos e outros animais; causar acidentes em estradas; interromper processos ecológicos como a sucessão e a recomposição vegetal; alterar e até secar drenagens naturais ao chafurdar em nascentes e corpos d’água; destruir culturas agrícolas como milho, soja e cana-de-açúcar, entre tantos outros impactos”, lista o pesquisador.

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De acordo com dados reunidos pela pesquisa, no Mato Grosso do Sul há grande incidência de ataques a plantações por bandos de javalis tanto na região sul, grande Dourados e arredores, passando pelo centro e chegando até o norte e leste do estado. São mais de 60 municípios com rastros de destruição deixados por javalis. Em Rio Brilhante, por exemplo, prejuízos estimados em uma única plantação de milho, um dos principais alimentos da espécie, chegaram a 1,5 milhão de reais. Em outras regiões, agricultores registraram perdas de até 30% das áreas plantadas.

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“Agora imaginem os prejuízos de javalis/javaporcos em escala nacional, sobretudo em regiões onde cultivos de milho, soja, cana-de-açúcar são amplos e abundantes. Qual será o real montante de prejuízos, considerando que essa invasão de porcos ferais já atinge 22 estados nas cinco regiões do Brasil? Certamente alcançam a ordem dos bilhões de reais”, avalia o Doutorando, que ressalta ainda que órgãos federais e estaduais coordenam e realizam o monitoramento sanitário das populações asselvajadas em conjunto com o de rebanhos domésticos. Porcos ferais são reservatórios móveis de uma série de doenças transmissíveis a rebanhos comerciais e ao homem, se constituindo em vetores de riscos constantes à suinocultura e bovinocultura do País.

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Mapeamento

A pesquisa de doutorado, intitulada “Porcos ferais invasores em paisagens naturais e agrícolas do Mato Grosso do Sul: modelos de ocupação, distribuição e gestão” tem orientação do professor Antonio Conceição Paranhos Filho, coordenador do Laboratório de Geoprocessamento para Aplicações Ambientais (LabGIS/UFMS), onde trabalha a equipe.

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Ao começar o mapeamento, o pesquisador reuniu publicações e dados institucionais de diversas entidades públicas e privadas. A partir do quadro inicial, o Doutorando passou a circular o estado e a realizar entrevistas individuais com moradores, produtores rurais, gestores públicos, caçadores, pesquisadores e demais atores que conhecem e lidam com os animais ou estão comprometidos com o assunto. Para tanto, Fischer desenvolveu um protocolo padrão de entrevistas estruturadas, aplicadas de maneira individual com cada voluntário interessado, buscando pessoas das mais diversas localidades do estado.

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Coletadas essas informações, a pesquisadora e graduanda em Engenharia Ambiental Raquel Godoi, responsável pelas atividades de geoprocessamento, entra em cena. “Temos imagens de satélite da cobertura do Estado sobre as quais plotamos uma grade de células hexagonais com 16 Km² cada. Classificamos essas células quanto aos tipos de cobertura do solo, se é vegetação ou água, estabelecendo métricas da paisagem. Agora iremos inserir as informações da distribuição dos animais para relacionar então as ocorrências com os tipos de paisagem preferenciais da espécie. Ou seja, poderemos verificar se os grupos de javalis aparecem mais em determinadas áreas em função do tipo de vegetação ou por conta dos corpos d’água próximos e assim por diante”, explica. Fischer elucida que as dimensões das células (16km²) foram definidas por superarem o tamanho máximo conhecido da área de vida de grupos de javalis asselvajados (até 15km²). “Assim a gente garante que javalis detectados por pessoas em diferentes células não sejam os mesmos já registrados em células próximas”, endossa.

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Agora, na reta final da coleta de dados, o protocolo padrão de entrevistas estruturadas está sendo aplicado em formulário eletrônico, visando ampliar o alcance de colaboradores. A ideia é cobrir lacunas e trazer subsídios complementares para a validação das informações com o cruzamento e refinamento de dados.

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“Criamos o e-mail javali.ufms@gmail.com, pelo qual pessoas que tenham informações sobre javalis/javaporcos em Mato Grosso do Sul possam entrar em contato, receber o formulário de perguntas e trocar ideias e informações sobre os tipos de ocorrências e sua localização. Estamos disponibilizando também o link de acesso ao formulário online, para que interessados tenham fácil acesso. O questionário é rápido e não costuma levar mais do que 15 minutos para ser concluído. Nossa pesquisa é de utilidade pública e não apresenta qualquer vinculação com instituições de fiscalização e controle. Assim, asseguramos aos colaboradores sigilo e anonimato resguardados em todas as etapas da pesquisa e que as informações fornecidas serão utilizadas de forma impessoal, estritamente para atingir os objetivos da pesquisa. Já obtivemos contribuições bem bacanas, mas ainda buscamos o máximo de informações, sobretudo de áreas mais remotas do estado. A participação da sociedade é imprescindível para ampliar, checar e aprimorar o mapeamento, dando mais precisão ao geoprocessamento da distribuição espacial das populações de javali/javaporco no estado”, reforça Wagner.

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SE VOCÊ TEM INFORMAÇÕES E INTERESSE EM COLABORAR, ACESSE:

goo.gl/forms/OOpuKIaRlfBsTqLt1

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