Infectologista tira dúvidas sobre questões relacionadas ao coronavírus

Em entrevista concedida ontem, 17, à Rádio Educativa UFMS 99,9 a médica infectologista da Faculdade de Medicina Mariana Croda falou sobre o coronavírus (COVID-19). Confira as principais informações a seguir:

 

1. Como surgiu o coronavírus e como está o atual cenário da doença?

Já conhecemos o vírus há alguns anos e inclusive já tivemos outras epidemias do coronavírus, mas ele tem a capacidade de mutar-se e causar diferentes tipos de doenças, o que ocorreu novamente. Ele surgiu na China, muito provavelmente da contaminação de animais, e se propagou para o mundo causando a pandemia, que é a infecção presente em todos os continentes.

 

2. Como o coronavírus age no organismo e quais os grupos de maior risco?

O COVID-19 é um vírus cuja letalidade, ou seja, cuja capacidade de causar a morte se dá pela insuficiência respiratória. A infecção causada no pulmão não permite que a troca de oxigênio funcione adequadamente. A doença comumente é uma gripe, como já vivemos com a influenza e como vivemos em 2009 com a H1N1, só uma pequena parte vai evoluir para essa insuficiência respiratória. O Brasil recebeu essa pandemia com a experiência de outros países e por isso sabemos que o grupo maior de risco, diferente das outras epidemias passadas, são os idosos e pacientes que já têm doenças crônicas.

 

3. Como o vírus é transmitido e quanto tempo ele vive fora do organismo?

No Brasil, temos temperatura e umidade em condições bem diferentes de outros países afetados, por isso estimamos que a transmissão aqui se dá muito mais por meio das mãos contaminadas que levamos à mucosa, do que pelas vias respiratórias. Por via respiratória o contágio é pela aspiração de gotículas, por meio das mãos contaminadas se dá por pegarmos no ambiente onde o coronavírus está e levarmos as mãos aos olhos, nariz e boca, permitindo a entrada do vírus no organismo. Um estudo recente mostrou que o vírus não morre rapidamente no ambiente, podendo sobreviver por até 72 horas, ou seja, em torno de 2 a 3 dias. Por isso que o cuidado hoje todo está focado na higienização dos ambientes e principalmente na higienização das mãos.

 

4. Como se proteger devidamente, por que o álcool em gel é o recomendado e como fazer a correta utilização dele?

O ideal é a lavagem das mãos com água e sabão. O sabão é uma gordura e também consegue permanecer nas mãos por mais tempo. O álcool em gel deve ser usado quando não pudermos fazer a lavagem das mãos, quando, por exemplo, estamos fora de casa, no transporte, ou andando da rua, quando encostarmos em algum objeto ou local como um corrimão ou no ônibus, então saindo desses ambientes o ideal é fazer a higienização com álcool em gel. E ele é diferente do álcool líquido porque o líquido evapora rapidamente, já o álcool em gel permanece tanto no ambiente como nas mãos por mais tempo, além da praticidade de poder levá-lo com mais segurança. E não existe um padrão de quantas vezes você deve lavar as mãos, por exemplo, se você trabalha no computador você chega e higieniza a sua área de trabalho. Se você não saiu dali daquele ambiente por horas então não precisa ficar levantando toda hora para lavar as mãos, mas se você saiu foi ao banheiro ou utilizou um bebedouro, por exemplo, aí sim você faz a higienização das mãos.

 

5. E na limpeza do ambiente, por quanto tempo o álcool em gel ou até outro tipo de agente de limpeza é eficiente para combater o coronavírus?

A última recomendação do Ministério da Saúde para a limpeza do ambiente é para a higienização com saneantes que normalmente já usamos em casa. Os desinfetantes matam, sim, o vírus, então a gente não precisa de nada específico. O que podemos observar é mudar os padrões de limpeza, há locais que não higienizamos comumente como maçanetas, bancadas, temos de mudar nosso olhar e tentar ver esses ambientes pensando em todos os locais. Recomendamos também o uso de hipoclorito, que tem nomes comerciais como QBoa e Cândida, numa proporção de um para nove, ou seja, uma parte de hipoclorito para nove de água. Você pode colocar num borrifador ou num balde e usar na higienização diária.

 

6. Como estamos com relação à possibilidade de vacinas e de medicamentos específicos contra o COVID-19?

O Brasil já recebeu essa epidemia com a experiência de outros países e quando a gente pensa nessa restrição social, em achatamento de curva de contágio, que tem se falado muito nas mídias, ou estender esse período, é também na esperança de que surja um tratamento ou uma outra proposta de contenção, que a gente ganhe tempo. O desenvolvimento de vacinas e de medicamentos não é simples, os protocolos que temos de seguir por conta de todas as questões éticas envolvidas em testagem em humanos não permitem que isso saia em menos de seis meses a um ano, então não temos isso em vista a curto prazo. O que aguardamos com mais esperança no momento é a testagem dos medicamentos. Estamos vivendo a fase da epidemia em que ainda não temos muitos pacientes internados, então esperamos que, quando estivermos na fase com mais pacientes internados já tenhamos uma medicação minimamente eficaz.

 

7. Como lidar com as notícias falsas em relação ao COVID-19?

Estamos vivendo a primeira pandemia nessa era da informação em tempo real, com as redes sociais. Vermos hoje pessoas na rua ou nas empresas lavando as mãos e usando o álcool em gel significa que realmente a informação chegou e o papel da imprensa é fundamental nesse processo. Fico feliz de ver que as pessoas já estão conscientizadas de que não é uma coisa simples a enfrentar, mas que nós vamos passar por isso e que temos condições agora de passar por isso de uma maneira mais ordenada e mais eficaz. O grande problema é que as fake news geram algo que é desnecessário que é o pânico. Num país do tamanho do Brasil com dimensões continentais a distribuição da doença não será de forma uniforme, nós vamos viver a epidemia em diferentes estágios. Quando começamos a ter ações precipitadas perdemos o tempo ideal de agir e isso se prolonga por muito tempo. As fake news fazem isso, fazem com que a sociedade se desespere, tome medidas excessivas ou de alguma forma minimize a pandemia e ache que não é necessário tomar as medidas que estão sendo tomadas. Isso causa desorientação e afastamento de uma forma ordenada de ações.

 

8. A Sra. faz parte do Comitê Operativo de Emergência da UFMS, o que ele faz?

O papel fundamental do comitê é, a cada emergência de saúde, conseguir realizar ações direcionadas não só pro controle, mas para a minimização de danos. Devo destacar que o comitê da Universidade Federal não só se consolidou de uma maneira muito forte, com especialistas e com toda a comunidade universitária, mas principalmente começou no tempo certo. A Universidade vem se preparando justamente porque esse comitê, que tem o papel de prever as ações, estudar as evidências e propor medidas mais eficazes para a comunidade universitária, se debruçou sobre esse assunto, se preparou.

 

9. Quem é o porta-voz oficial da UFMS em relação ao COVID-19?

A reitoria lidera esse processo e a vice-reitora Camila Ítavo é a presidente do comitê. A reitoria e a comunicação ligada diretamente à reitoria farão a disseminação das informações geradas no comitê, para que não haja desinformações ou que as informações sejam repassadas de forma truncada e ineficaz.

 

10. Para finalizar, qual a mensagem ou recomendação em relação a tudo o que está acontecendo?

A minha recomendação é justamente essa: busquem informações, pesquisem, vejam os exemplos dos outros países e entendam que existem várias pessoas tentando fazer com que o Brasil, a nossa experiência, seja diferente. Então não compartilhem informações falsas, não compartilhem informações que não vão contribuir. Este não é ainda um momento de pânico. O governo, o estado, os municípios já estão municiados de informação e nós estamos preparados para fazer uma história diferente aqui no Brasil e no Mato Grosso do Sul.

Texto: Ariane Comineti