Barraca onde se vende chifres de antílope, crânios de crocodilo e uma diversidade de crânios de carnívoros e primatas, em Benin. Foto: Anthony B. Cunningham

Estudo aponta uso de 521 espécies de mamíferos no tratamento de doenças, incluindo 155 ameaçadas

Pelo menos 521 espécies de mamíferos em 131 países do mundo estão sendo usadas pela população local para o tratamento de 371 doenças. Esse é o resultado de uma revisão de pesquisa etnobiológica global, realizada por pesquisadores brasileiros, entre eles o professor Diogo Provete, do Instituto de Biociências (Inbio/UFMS).

Foto: Rômulo Alves

“Nós encontramos relatos de ao menos 65 espécies sendo usadas para fins medicinais aqui no Brasil, um dos países com maior número de espécies sendo usadas para este fim. Entre as espécies estão o gato-mourisco, veado-mateiro-anão, veado campeiro, boto, bugio marrom”, afirma o professor Diogo.

Uma das preocupações é que um número considerável de espécies está na mira da extinção. Em seu banco de dados, os pesquisadores avistaram 155 espécies de mamíferos consideradas ameaçadas (vulneráveis, em perigo ou criticamente em perigo) e outras 46 estão quase ameaçadas.

Para o grupo, a superexploração para uso medicinal pode ser uma fonte negligenciada de ameaça que deve ser considerada nas avaliações de conservação de espécies de mamíferos.

“Também comentamos que os nossos resultados podem ser usados para prever onde e em qual espécie podemos ter o próximo evento de spillover, quando um vírus “pula” de uma espécie selvagem pra humanos”, expõe o professor Diogo.

Análises

A etonolobiologia estuda a “dinâmica de relacionamentos entre pessoas e seus grupos culturais, biota, e o meio ambiente, desde o passado distante até o presente imediato”.

Para analisar os dados, os pesquisadores utilizaram um conjunto de análises estatísticas que consideram o parentesco evolutivo entre as espécies, chamados Métodos Comparativos Filogenéticos, obtidos de literatura primária via busca no Google Scholar e outras fontes.

Ao analisar os fatores ecológicos e evolutivos do uso de mamíferos selvagens na medicina tradicional, os pesquisadores confirmaram a hipótese de que espécies intimamente relacionadas são mais semelhantes em termos de sua versatilidade médica percebida do que espécies distantemente relacionadas e geralmente são usadas para tratar doenças semelhantes.

Foto: Itamar Barbosa

Também foi demonstrado pelo estudo que mamíferos mais pesados são considerados terapeuticamente mais versáteis do que os mais leves. Assim, os pesquisadores sugerem que futuras iniciativas de conservação levem em consideração o uso medicinal de mamíferos ao lado da pressão da caça por alimentos.

“Ingredientes derivados de mamíferos selvagens são amplamente usados ​​em remédios tradicionais. Grandes conjuntos de dados de características, distribuição geográfica e filogenia também estão disponíveis para mamíferos. Portanto, os mamíferos são um grupo ideal para explorar os correlatos ecológicos (por exemplo, tamanho de alcance, massa corporal) e evolucionários (ou seja, ancestralidade compartilhada) do uso de produtos derivados de animais na medicina tradicional”, afirmam.

Mais informações sobre esse estudo podem ser obtidas no artigo “A global analysis of ecological and evolutionary drivers of the use of wild mammals in traditional medicine”, publicado recentemente na Revista Mammal Review.

Texto: Paula Pimenta